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Segunda onda da Covid-19 em Goiás



"Cansada e desanimada fiquei hoje aqui no plantão ao entubar uma paciente de 28 anos. E, pasmem, ainda encontro pessoas nas ruas e no consultório que acham que a doença é meramente política." Quando fez esse desabafo em seu perfil no Instagram no dia 27 de fevereiro, a cardiologista Kécia Amorim não imaginava que o pior estava por vir. Nesta terça-feira (9) ela contou ao POPULAR que decidiu pedir exoneração de uma unidade de saúde pública em Goiânia. "Pedi demissão porque não estou aguentando mais. É um filme de terror. Estou no meu limite."


A médica, que é plantonista na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC/UFC), disse que o crescente número de casos de Covid-19 é assustador. "Nesta segunda onda o tratamento está mais difícil. Os pacientes, cada vez mais jovens, chegam graves, com prognósticos muito ruins. Com dois ou três dias com a doença não conseguem ir para a ventilação não invasiva, já precisam ser entubados e começam hemodiálise." Segundo ela, no último plantão que fez foram dez admissões de pacientes na UTI, com três paradas cardíacas e dois óbitos.


Três mulheres, duas de 27 anos e uma de 24 anos, chegaram grávidas, tiveram de ser submetidas a cesarianas e seguem em estado grave, entubadas. A mais jovem esperava gêmeos. Após o parto, um dos bebês testou positivo para Covid-19 e também está na UTI. O outro recebeu alta. A mulher está com 80% dos pulmões comprometidos.


Também no último plantão chamou a atenção da cardiologista o caso de um paciente de 38 anos, sem nenhuma comorbidade. "Ele ficou dois dias em casa tentando tratamento com oxigênio, após orientação de um médico do interior, o que está errado. Quando ele chegou no HC, fez ventilação não invasiva, mas não tolerou e precisou ser entubado. Quando peguei os exames, já pedi hemodiálise com urgência. Ele não resistiu."


Kécia Amorim, uma mineira formada há 20 anos e há 8 em Goiânia, explica que há muitos anos não fazia plantões em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS), mas com a pandemia do coronavírus (Sars-CoV-2), se sentiu na obrigação de voltar em razão da escassez de profissionais habilitados para UTI. A médica explica que o HC tem estrutura e uma excelente equipe formada, em sua maioria, por especialistas, e os pacientes são muito bem cuidados. "Dos pacientes de Manuas que atendemos, a taxa de mortalidade foi baixa, mas agora os doentes estão muito graves. Chegam com saturação baixa e logo evoluem para embolia pulmonar e insuficiência renal. O tratamento fica muito complicado."


A médica atende também no pronto-socorro de um hospital privado e não vê diferença na rotina. "O terror é o mesmo. Ontem comecei a chorar porque abri a porta do consultório e vi o filho de uma senhora brigando com a filha de outro paciente porque queriam ser atendidos primeiro e não tinha leitos. A espera de atendimento para um paciente grave é de quatro horas. Ontem (8) entubei dois, consegui vaga na UTI para um e a outra ficou lá porque liguei em 25 hospitais e não tive sucesso."


Kécia Amorim conta que o trabalho está levando os profissionais de saúde à exaustão porque, além do aspecto emocional, não há tempo para comer, tomar água ou ir ao banheiro. "Um colega desidratou porque esqueceu de tomar água." Mas ela não considera esse o pior cenário. "A maior tristeza, além de entubar um paciente de 27 anos com 90% do pulmão comprometido, é saber que ele não vai sobreviver. Temos de receber a família e pedir que assine um termo de consentimento para que possamos fazer tudo o que é necessário. Quando me pergunta se há chance, eu sei que é só por Deus."


Esgotamento

A cardiologista não é o único profissional de saúde que tem usado as redes sociais para tentar alertar a sociedade da gravidade do momento sanitário. Em Catalão, região Sul de Goiás, André Cândido Júnior, que trabalha em hospitais públicos e privados, escreveu em seu perfil no Instagram: "Os recursos estão escassos, os profissionais não suportam mais essa carga de trabalho. Nós que estamos em UTIs, hospitais de campanha, pronto-atendimento, estamos cansados, esgotados, estressados, depressivos e desanimados com o rumo que nossa sociedade está levando."


O médico, que tem 27 anos e um ano e meio de formado, foi além. "Vou dizer uma coisa pra vocês, que já deveria ser óbvia: não existe tratamento precoce, não existe remédio milagroso, o que existe é a assistência multidisciplinar, o cuidado, o amparo e com essa demanda atual é impossível realizar qualquer tratamento com excelência, seja você SUS ou particular."


Na capital, a reumatologista Yara de Paula Duarte Lacerda contou em seu perfil que o atendimento do pronto-socorro para síndrome gripal no hospital particular em que trabalha na capital foi fechado nesta terça-feira (9). "Chegamos ao nosso limite máximo de atendimento. Não há leitos de UTI, apartamentos e enfermaria para essa patologia. Nosso pronto-socorro está na verdade funcionando como uma UTI, com 12 pacientes sendo atendidos intensamente e aguardando a regulação que não acontece. Nossos colegas e colaboradores se dedicando ao extremo para manter a vida desses pacientes até a regulação."


Nesta terça-feira (9), a pneumologista e pesquisadora clínica paulista Letícia Kawano, que coordena o Projeto Respira Evidência, fez em seu perfil alertas para todas as regiões do Brasil sobre a situação da pandemia, A médica, que conta com quase 50 mil seguidores, disse que o Centro-Oeste vive um momento complicado. "Caso medidas públicas não sejam tomadas, vocês, dessa região, devem tomar medidas individuais de cuidados: desmarquem consultas, exames e procedimentos que não sejam urgentes, evitem aglomerações, fiquem o máximo quietos para diminuir o risco de desencadear qualquer necessidade de hospital, com um trauma."


Reportagem feita pelo jornal O Popular



Dra. Kécia Amorim Médica Cardiologista CRM GO 13874 RQE 10821 AGENDE UMA CONSULTA


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